4 de agosto de 2010

A humanidade é o sapo.

Estamos na fronteira de um mundo novo, aonde tudo está sendo questionado!

Colocamos e somos colocados contra a parede todos os dias. Tudo aquilo que considerávamos imutável e de grande valor, pois havia um manto emocional e racional sustentando o protagonismo de uma visão qualquer, agora é castelo de areia.

Neste instante da nossa história, qualquer pessoa mais sensata consegue sentir que estamos num momento de escaldo. Numa analogia com a parábola do sapo na panela de água fervente, a humanidade, no lugar do batráquio, já cozinhou bastante e cozido vivo, procura uma salvação.

Amedrontados e desesperados, questionamos:

Quanto tempo falta para o sapo?

É claro que a pergunta está atrasada! O caldo já borbulha e estamos dentro da panela por muito tempo.
Então, não vale a pena perder tempo em respondê-la. Aos que insistem nela, lembro que a pergunta revela uma certa preguiça e um tanto de egoísmo.

Também, ingenuamente nos arriscamos a propor soluções genéricas do tipo:

"Apaguemos as chamas, retrocedendo no tempo, pois nossos antepassados garantem que alguns sapos coaxavam felizes na lagoa primitiva!"

Mesmo que isso fosse verdade, não temos nenhuma garantia que a velocidade de decaimento da temperatura cessará a corrosão dos tecidos importantes ou sequer cicatrizará as feridas abertas, mantendo o coachar da vida.  Para piorar nossa condição de "sapo", sabemos que tal chama possui um mecanismo perverso. Não é possível apagá-la, pois nos modelos da humanidade que criamos, precisamos constantemente realimentá-la.

Assim, tecemos um paradoxo angustiante para a humanidade!

Na perspectiva do sapo, nós nos colocamos na panela com água e também acendemos o fogo.
Agora, já com a carne em frangalhos, confortados neste ambiente sadomasoquista, sequer podemos desligar a chama ou saltar para fora da fervura.


Então, a energia cinética acumulada pelo conhecimento humano nos impede de retroagir de forma intencional, mas é a única alternativa para dar um salto para bem longe da panela.

Então, o que nos resta?

Mesmo cozinhando, por um curto período de tempo, teremos que criar um novo sistema homodinâmico que irradiará o calor necessário aos nossos vícios. Concomitantemente, essa nova energia também deverá revigorar os nossos tecidos já muito deteriorados. E o ânimo desta nova chama será a coragem de induzir, de forma consciente, a humanidade para um estado de profunda metamorfose.

Assim, temos que ter a valentia natural e instintiva da lagarta que enfrenta a quase-morte para se transformar em crisálida. Não saberemos se renasceremos como borboleta, bruxa ou nada. E, sinceramente, isso não importa, pois já está claro que não é mais possível viver no papel de sapo!

Logo, a única questão que interessa é:

Teremos coragem para tal metamorfose?

[]s

Paulo Ganns

3 de agosto de 2010

Mais feliz? Bastaria um país com governos sérios!

A felicidade acaba de ser empacotada. 

Não! Não é mais uma campanha de marketing da felicidade que está bombando na mídia.
Também não é uma pílula nova, com a tão sonhada droga do bem estar incondicional. 
Se você acha que é um livro novo de Paulo Coelho, errou novamente!

É a PEC da Felicidade! (Dá um samba, hein?)

Agora sim, a felicidade, tornou-se objetivo dos nossos governos!  Era só isso que faltava? 

Sim! Sorria, a "PEC da Felicidade" já está rolando no congresso.
Já tramita e diferentemente de outros assuntos menores que emperram no caminho das nossas infelicidades, terá sucesso retumbante, pois correrá rápido e não haverá político que ouse ser contra a nova razão da nação!

Já era hora, pois qualquer pessoa deste país, analfabeta ou alfabetizada, sabia que o que faltava mesmo era a PEC da felicidade. Se o conceito da felicidade não estava na nossa constituição, como é que os nossos líderes, nos três poderes, poderiam saber o que fazer no poder? Faltava era esse norte! 

OK! Foi uma falha lastimável dos constituintes. Há que se entender que na época, nossa democracia era muito nova e os constituintes tinham outras prioridades para por fim à ditadura!

Então, curioso para ver o que mudou?

Se você tem preguiça de ler a constituição do Brasil, tenho outra boa notícia. A emenda é pequenininha, mas de uma genialidade incrível. 

Aí vai o artigo:

“Art. 6º. São direitos sociais, essenciais à busca da felicidade, a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.”

Confesso que quando li, chorei!

Sei que não foi tão original, pois seguimos a tendência dos discursos de governos pelo mundo afora. O que antes era um estado de espírito, um sentimento, um momento abstrato no balanço da vida de cada ser humano, tornou-se concreto, mais um produto pronto para ser entregue, agora pelo estado. 
Acabamos fazendo justiça à nossa história, já que nenhum governo brasileiro foi intencionalmente contra a felicidade. Eles só falharam porque careciam desta bússola.
Corrupção, desrespeito às leis, violência de todas as maneiras, safadeza geral e irrestrita, aconteciam somente por falta desta PEC! 

Opa! Nem tudo são flores.

Sendo um pouco crítico, talvez não fosse tão necessário o novo Art. 6º. Afinal, a grana que se gastou na elaboração do www.maisfeliz.org (com seus bugs, links quebrados e fotos de gente e políticos felizes e reluzentes) pode fazer falta em alguma festa comemorativa na promulgação da PEC.

E aquela história de que o brasileiro é um povo feliz?

Ah! A gente vai ter que dar "um jeitinho", mais um, nas análises que atestavam que o brasileiro sempre se viu como um povo feliz! Uma boa ideia seria culpar os institutos de pesquisa. 

Então, povo deste Brasil, seja feliz, pois a PEC era só o que faltava! 

Dica: Comemore comprando "amor" naquela lanchonete que tem um M amarelo!

[]s

Paulo Ganns

Hoje eu queria ver a cara do autor da frase: "O Brasil não é um país sério!".

18 de julho de 2010

As religiões, por si só, são instituições antidemocráticas!



Ao ler o documento ”Orientações e Critérios para as próximas eleições” (Bispos Do Regional Leste 1 Da Cnbb) vejo questões profundas e incoerências surgirem destes juízes e de seus juízos, que alegam trazer algum discernimento aos eleitores na seleção de seus candidatos.

Embora almejem servir de filtro mágico para seleção de pessoas “do bem”, agem como ferramentas antidemocráticas, filtrando muitas lideranças no lado “não passa”, por se mostrarem contrárias a determinados paradigmas anacrônicos, atrasando a evolução da sociedade democrática.

Muito embora desejem nestas compilações, atacarem problemas como a corrupção e a desigualdade social, ao associarem nestes tratados temas diversos como aborto, ensino religioso obrigatório, casamento entre homossexuais, adoção de crianças por casais homoafetivos, legalização da prostituição, das drogas e até tráfico de mulheres, acabam criando relações de causa e efeito inexistentes, trazendo mais confusão na já complexa prática da democracia!

Como exemplo das distorções à democracia, num simples exercício interpretativo dos tais critérios colocados no referido, chegamos em afirmativas subliminares bizarras, das quais aponto algumas:

  • O aborto no país será menos praticado por votarmos em pessoas que pertencem à determinada religião!
  • Se votarmos em pessoas que apóiam a descriminalização do aborto e do consumo de drogas, as desigualdades sociais tendem a piorar!
  • As pessoas que se dizem, no discurso político, praticantes fundamentalistas de determinados credos são menos susceptíveis à corrupção!
  • O reconhecimento legal da união entre homossexuais através do casamento civil e o aceite legal da adoção de órfãos por estes, provocará um acréscimo nos níveis já alarmantes de corrupção e de violência!

Obviamente, se existe alguma conveniência nestes ensinamentos, já que sabedoria não há, quem se beneficia da mesma são as próprias instituições religiosas dominantes, ato em si muito antidemocrático.
 

Ainda no texto, é impossível não perceber outras incoerências quando se alega defender o princípio da solidariedade, já que quem alega defendê-la, fere o mesmo princípio quando exclui e marginaliza pessoas que não se encaixam nas suas interpretações do que venha a ser o ideal de comportamento humano, isto porque alegam ser portadores da interpretação de um ser divino.
 

Piora ainda quando limitam o exercício dos direitos sociais em trabalho, moradia, saúde, educação e segurança, esquecendo-se da cultura, onde creio que todos os credos se incluam. Mostra ainda uma ignorância esperada, quando não entende que a liberdade sexual faz parte do direito à saúde, coisa que para algumas instituições do ramo é negada aos próprios ordenados.

No frigir dos ovos, ao afirmarem que critérios religiosos colaboram com a liberdade, a partir de uma perspectiva sombreada por dogmas que somente se justificam em cultos e são intrínsecas à fé de cada pessoa, essas instituições acabam agindo como muralhas ao que se entende ser o pleno exercício da democracia. 

No meu entendimento, a democracia não deve ser entendida como outra instituição. Diferentemente de instituições religiosas que são, via de regra, inflexíveis quanto ao comportamento humano, a democracia deve ser tratada como um processo maleável de construção de uma sociedade equitativa, no cerne do indivíduo, harmonizando direitos e deveres dos que aceitam os seus pares, circunscritos dentro de um estado!

Assim percebido, fica claro que instituições religiosas devem aceitar o processo e nunca controlá-lo! É até admissível que participem do mesmo, com os devidos cuidados para a manutenção da laicidade e desde que não retirem direitos ou imponham deveres, baseando‑se em escrituras ou em interpretações de entidades divinas. Em suma, as religiões que crêem serem maiores que a democracia, criando visões, opiniões e discernimentos baseados em seus dogmas, dentro de um processo democrático, em lugar de luz, entregam a escuridão.

Ferem também a democracia quando almejam defender a liberdade de educação, misturando-se uma doutrina espiritual no mesmo pacote educacional, como se houvesse a opção “certa” para educar os filhos neste quesito. E convenhamos, apelar, tentando alicerçar tal argumentação com o infeliz “Acordo entre Brasil e Santa Sé”, é invalidar uma constituição laica, o que também fere a nossa democracia. Aos que acreditam que “O estado não é ateu!”, como lógica desqualificadora deste argumentação, pergunto se não seria o caso da emigração consciente para estados reconhecidamente religiosos?! Eles existem e servem “democraticamente”, pelo direito de ir e vir, para isso.

A laicidade do estado, a contragosto de muitos dirigentes religiosos, é a única opção de valor para qualquer estado democrático. Sem ser laico, não há como ser democrático. Os direitos humanos, como norma social, são superiores aos dogmas religiosos e é a constituição de cada país que deve abarcar regras de convivência pacífica entre as vertentes religiosas, agnósticas e atéias de uma sociedade. Tudo que escapa a esta lógica é antidemocrático. 


Por fim, dentro do documento apontado, concordo somente com a necessidade de valorização do voto. E fico só nisso, pois só ele não decide a vida pública. Ele é só uma das ferramentas, que associada a outras forças do estado e da sociedade, sempre coerentes com a sua constituição, elevam a democracia de um país. É através do voto que a liberdade individual tenta se manifestar. Tal liberdade será mais próxima do ideal quanto mais as religiões se restringirem às necessidades espirituais de seus seguidores. 

E a ironia disso tudo é que tais religiões, dentro do universo espiritual onde deveriam nortear algo, pelo nível de violência que assola a civilização, pelos padrões de consumo atuais, pelas incoerências entre pregações e ações de seus doutrinadores, pela falta de qualidade de valores humanos em sociedades ditas religiosas, me levam a questionar a sabedoria divina de seus próprios critérios de seleção.